MALEFACTOR – Paganismo sob a lei da espada
Postado em 12/10/2024


Com o início das suas atividades no longínquo ano de 1991 em Salvador, Bahia, o MALEFACTOR perpetuou uma sonoridade única, que mescla elementos do Death Metal, Black Metal e Pagan Metal, em seus seis álbuns de estúdio. Agora, em 2024, a banda prepara-se para o lançamento de um novo EP, sucessor do aclamado “Sixth Legion” (2017), prometendo elevar ainda mais o seu nome no cenário mundial. A equipe da Ghost Writer Magazine foi conversar com o baixista e vocalista Lord Vlad, para saber mais sobre os planos deste colosso do Metal extremo nacional, além de passar a limpo toda a sua carreira em uma entrevista extensa e muito especial.

– O MALEFACTOR iniciou suas atividades em 1991, e nos anos de 1993 e 1995, lançou suas primeiras Demo Tapes “Sickness” e “Into the Black Order”, respectivamente. O que você pode nos falar sobre esta época inicial na carreira da banda? Quais os ganhos que estes materiais geraram para vocês naquele período?

Lord Vlad – Saudações à todos. Em 1992 fizemos nossa primeira tentativa de uma Demo, mas ainda era algo muito primitivo e soou muito mal. Adicionamos mais um guitarrista, fiquei somente como vocalista e passamos a ensaiar todos os finais de semana por cinco, seis horas por dia. Em menos de um ano a banda tinha dado um salto qualitativo enorme, e começado a receber convites para shows. A “Sickness” foi gravada ao vivo durante um ensaio em estúdio, e para nossa surpresa, recebeu uma ótima resenha na Rock Brigade, que na época era a maior revista de Metal do país, feita pelo Perna do Genocídio. Vários zines começaram a fazer resenhas positivas e as coisas realmente começaram a mudar. Em 94 gravamos uma Demo em estúdio, mas que o Danilo (guitarrista) perdeu a master, sabe-se lá como. Juntamos uma grana, e em 95 fomos para o mesmo estúdio onde o Slavery gravou o álbum “Immortal Dismalness”, com o mesmo engenheiro/produtor austríaco Ephendy Steven (ex-Kreator). Essa tape nos rendeu convites para shows fora da Bahia e quando percebemos, estavam chegando cartas de todos os continentes (a internet ainda era algo muito recente e quase nenhum brasileiro usava). Saímos em vários zines e coletâneas em tape e até em CD, na hoje cult “The Winds of a New Millenium II”, lançada pela Demise Records. Acho que somente quatro bandas ainda estão vivas, das treze que saíram no disco.

– Lembro de um show antológico da fase “Sickness” ao lado do Mystifier, quando a banda lançava o “Göetia” em 1993. O que você se lembra desta noite em específico?

Lord Vlad – Lembro que fizemos um show foda e fazia muito calor!

– Dentro de uma realidade extremamente difícil para se lançar álbuns no Brasil, a banda conseguiu o feito de assinar com a Megahard Records para o lançamento de “Celebrate thy War” (1999). Como se deu o contato com a gravadora e hoje, passados mais de vinte anos do seu lançamento, qual a sua impressão sobre este trabalho?

Lord Vlad – Em 96 nós mudamos a formação e o som ficou ainda mais épico e complexo, então resolvemos desistir de gravar as músicas antigas e investir num disco totalmente inédito, e que pela primeira vez no país, mesclava Black/Death com Thrash e Heavy Metal tradicional, além de partes Folk. Apesar da gravação fraca, sempre leio e ouço metalheads mais die hard dizendo que é nosso melhor disco, provavelmente porque marcaram uma época de suas vidas. A partir desse disco, começaram as viagens pelo país e começamos a fomentar a ideia de tocarmos em outros países, já que estávamos próximos de completar 10 anos de atividade.

“Celebrate thy War” gerou muitos shows pelo país e ajudou a solidificar o nome do MALEFACTOR na nossa cena. Quais os momentos mais marcantes desta turnê? Nesta fase, inclusive a banda contava com dois tecladistas, algo meio incomum em formações da época.

Lord Vlad Hoje nem eu entendo que porra a gente queria com sete caras numa banda. Óbvio que ninguém ia contratar a gente para tocar fora da cidade (risos). Custava o mesmo que levar duas bandas. Basicamente o que rolou foi que Luciano (que até hoje toca na nossa banda irmã Veuliah), ajudou a compor o nosso line up, mas o irmão do Jafet (guitarrista) aprendeu a tocar teclados justamente para ser nosso tecladista. Só que na hora H resolvemos manter os dois, e parecíamos uma orquestra em cima do palco. Os grandes shows dessa época foram o de lançamento do “Celebrate Thy War” na Concha Caustica de Salvador, um local histórico, onde alguns anos antes tínhamos visto o Sepultura na tour do “Arise”, na sua melhor fase ao vivo. Em 2000 tocamos lá novamente e foi ainda melhor. Infelizmente não temos mais a gravação em vídeo desse show. Fizemos alguns shows pelo interior da Bahia e em Sergipe, mas já estávamos focados em dar um passo a mais e gravar o segundo disco, com uma qualidade superior e feito da forma correta. De lá para cá já tocamos outras vezes na Concha e é sempre um show muito diferente, daqueles que aparecem pessoas que você não via em shows há dez ou vinte anos.

“The Darkest Throne” veio na sequência em 2001 e trouxe uma grande e benéfica mudança no direcionamento musical do MALEFACTOR. Nele, a banda intensificou os vocais mais melodiosos, além de demonstrar influências do Death Metal sueco de bandas como In Flames e Dark Tranquillity. Tais mudanças ocorreram de forma natural ou foi algo estrategicamente pensado para aquele momento? Como você enxerga a importância de “The Darkest Throne” na discografia do grupo?

Lord Vlad – Que fique claro que o In Flames em 2001 ainda não tinha mudado tanto seu som, e ainda soava bastante “Gothenbourg”. Já o Dark Tranqulity é uma banda que ainda ouvimos até hoje, e junto com o At The Gates eles trouxeram nova sonoridade ao Death Metal. O termo melódico é coisa de revista e acaba criando uma barreira boba. Eu amo o Death Metal do mais podre e mórbido até os mais técnicos e com melodia. Todos do MALEFACTOR tocam ou tocaram em outras bandas de Death Metal mais old school, faz parte do nosso background. A influência da cena grega continuava ali também no disco, mas incorporamos violões como o Bathory na fase Viking, sem medo de arriscar. Chegamos até a fazer uma música totalmente Folk, que na época fez alguns metalheads nos odiarem, e hoje muitos ficam cobrando para que façamos mais músicas assim. Claro que hoje eu faria algumas coisas bem diferentes, porque ele é um disco versátil até demais e feito em dois períodos diferentes, com duas formações no mesmo disco. Até hoje também divide opiniões com os seguidores mais antigos, que divergem entre ele e o “Celebrate Thy War” como nosso melhor álbum.

– A primeira passagem do MALEFACTOR pela Europa foi justamente na turnê de promoção de “The Darkest Throne”. Quais lembranças você tem deste giro pelo velho mundo? Países que tinham público mais radical, receberam bem a sonoridade plural de vocês?

Lord Vlad – Não existe país com público mais radical que o brasileiro. Mas tudo foi aprendizado. Viajamos ainda antes dos smartphones, GPS e equipamentos de fácil acesso. Ainda era bastante difícil para uma banda underground sem gravadora dando suporte, e também nenhuma banda de Metal extremo do Nordeste tinha ido à Europa, fomos a primeira a ir lá. Era o momento também daKrisiun Mania”. Muitos queriam ouvir clones do Metal ultra mega rápido, mas nunca foi nossa praia. Mesmo no início, sempre fomos uma banda técnica e com muitas partes cadenciadas. Assim como eu não gostava de várias bandas da época, com certeza não agradamos a todos, e nunca agradaremos. Normal. O que fez o MALEFACTOR ter algum nome foi justamente o fato de sermos diferentes durante muito tempo, hoje não dá nem para acompanhar tudo que acontece na cena, e tem moleques de quatorze anos tocando mais que o Dave Lombardo (ex-Slayer). Quem fizer Metal pensando em agradar ao público ao invés de fazer a música que acredita, está fadado ao fracasso. Mas fizemos muitos contatos e amigos pela Europa, e é uma pena que não tivemos tantas turnês lá fora quanto deveríamos. Mas ainda estamos vivos e prontos para a guerra. E a Europa é tudo muito perto. Você viaja três horas e já mudou o idioma, a cultura, o cenário. É tudo muito diferente daqui, com nosso país gigantesco e tudo muito longe.

– Com a enorme aceitação de “The Darkest Throne”, em 2003, “Barbarian” veio cercado das expectativas mais positivas possíveis. Acredito que o terceiro álbum da banda foi uma progressão natural do que foi apresentado no seu antecessor. Você partilha deste mesmo ponto de vista?

Lord Vlad – “Barbarian” foi nosso primeiro disco realmente gravado com os cuidados e tempo confortável de estúdio. Tivemos um apoio enorme do selo Maniac Records. Parece inacreditável hoje quando contamos que a gravadora pagava o estúdio, pagava videoclipe, e ainda montou um show de lançamento numa casa fantástica, com mil e quinhentos pagantes para ver uma banda de Metal extremo local. Devemos muito à eles e serão irmãos eternos na nossa família. Talvez sem essa ajuda nem teríamos continuado porque estávamos presos a um péssimo contrato com a gravadora que lançou o “The Darkest Throne”. A Maniac teve que pagar uma multa alta para ficarmos livres, e sequer fez questão de assinar conosco. Foi tudo feito na amizade e confiança no nosso potencial. O Metal da Bahia, não só o MALEFACTOR, deve muito ao pessoal da Maniac que desde a década de 80 acreditou nas bandas locais.

– Um ponto alto na turnê de “Barbarian” foi a participação de vocês no saudoso festival Brazil Metal Union em São Paulo, no ano de 2004. Este show, inclusive, rendeu o DVD “Live in BMU 2004”, que atualmente é um item raríssimo. Você acredita que ali, o MALEFACTOR estava no seu melhor momento, entregando sua melhor performance ao vivo?

Lord Vlad – Não, hoje estamos muito melhores, muito mais entrosados e experientes. Mas ali foi o melhor momento para nós enquanto reconhecimento no país. Era uma época que as pessoas ainda liam muito as revistas de Metal, e estávamos sempre presente nas maiores delas. Mas ao vivo estamos muito mais entrosados e o show é muito mais agressivo. A banda hoje está no ponto exato entre o som do início e mantendo a veia épica só que bem mais econômica, sem tanta “pompa”. Agora, claro, história é história. Quando você marca uma época para alguém, a memória afetiva não se apaga, tanto que ouço todo tipo de comentário “minha fase preferida é a das Demos”, “hoje vocês são uma máquina ao vivo”, “não gosto do disco tal, mas amo disco tal”. Isso é normal, acontece até com as gigantes. Eu mesmo sou fanático por Iron Maiden, mas não sou apaixonado cegamente por nenhum disco depois do “Seventh Son of a Seventh Son” que saiu em 1988. Daí a dizer que eram melhores ao vivo antes, é a porra da memória afetiva. A banda continua perfeita, e fazendo ótimos discos, mas sou de outra geração. Quem nasceu 15, 20 anos depois de mim, já é apaixonado por “Fear of The Dark”. Se são assim com as gigantes, imagine com as undergrounds que o cara quer criticar até a cor da guitarra do músico. Foi mágica a época do BMU, mas não vivemos pensando o tempo todo no passado, ainda estamos vivos depois de 30 anos. Isso é muito raro em se tratando de underground. 30 anos sem parar nunca, que fique claro.

“Centurian”, seu quarto álbum, inicialmente foi pensado para ser um EP. Por quais razões vocês mudaram o formato do material? Na minha ótica, esse disco foi o mais maduro da banda e o que de fato apresentou uma assinatura própria. Como você enxerga “Centurian” dentro deste contexto?

Lord Vlad – Eu não lembro muito bem se seria um EP, o fato é que as três primeiras músicas são uma trilogia de fato. Elas se completam, tanto musicalmente quanto liricamente. Não sei mensurar isso de disco mais maduro. Porque é algo muito pessoal. Como pode ser mais maduro se eu tinha 15 anos há menos quando fiz o disco? Imagina quantas e quantas coisas aconteceram de lá para cá em relação a estúdio, viagens, composições e formatos. Acredito que é mais sua memória afetiva. Um riff que você ouve há 20 anos, causa um impacto muito diferente de um que você ouviu há 3 dias. No cinema é diferente. Vários filmes nem devem ser revisitados porque você irá odiar. Já na música, geralmente escolhemos um ou dois ou três discos de uma banda e batemos um martelo “a banda jamais fará outro igual”. Ainda bem. Mas em 90% dos casos, os três primeiros discos acabam sendo os mais marcantes das bandas, mas não acho que sejam porque são melhores ou mais maduros, e sim porque é a fase que você desenvolve amor ao material. Depois tem milhões de outras bandas para se ouvir e a intensidade muda. Posso citar dezenas de bandas nacionais que fazem ótimos discos, mas mesmo eu ouvindo bastante jamais vou amar como o da época que conheci, por mais que as bandas lancem discos maravilhosos. Por isso o MALEFACTOR sempre gostou de ter pessoas mais novas no público. Elas não são “tabula rasa”, mas ainda estão descobrindo nosso som e mais abertas para as coisas novas. “Medusa”, que é um Single Demo que lançamos na pandemia é um exemplo disso. Foi ótima a aceitação dela nas redes sociais. Estas redes nem existiam como são hoje na época do “Centurian”. Mas acho um disco foda e tenho muito orgulho dele.

– Em “Centurian” temos a inclusão de duas regravações de “Celebrate thy War”. Além da faixa título, “Estuans Interius” marcaram presença em novas versões, melhor finalizadas e com arranjos inéditos muito bem vindos. Por qual razão vocês decidiram revisitar essas músicas?

Lord Vlad – Justamente pela precariedade da gravação original. Sempre ouvimos que era um de nossos melhores discos, mas com uma gravação muito aquém da qualidade das composições. Muita coisa se perdeu ali na gravação original.

– A regravação de “Celebrate thy War”, inclusive, trouxe a participação mais do que especial de Marcelo Pompeu da banda paulista Korzus. Por qual razão optaram por escolher um cara, de uma escola mais voltada para o Thrash Metal, para participar deste trabalho? Eu achei que o contraste ficou interessante, e enriqueceu muito a composição.

Lord Vlad – Pompeu é um dos pioneiros do Metal nacional, e estávamos gravando no estúdio dele, o Mr. Som, que é sensacional. Fomos super bem recebidos lá e além da voz do Pompeu, passamos a noite gravando corais, bebendo vinho e ouvindo histórias do Metal brasileiro, direto da fonte de quem estava lá no início de tudo. Sou amigo pessoal do Antônio do Korzus, muito antes dele entrar para a banda e concordo que ficou bem diferente e interessante esta participação.

– Outra presença em “Centurian” que merece destaque é a ex-vocalista do Silent Cry, Sandra Félix, em cinco faixas do álbum. Acredito que o objetivo tenha sido deixar os corais mais orgânicos, mas este é o meu ponto de vista. Qual a estratégia para a inclusão de Sandra nesta obra?

Lord Vlad – Sandra Felix é uma cantora maravilhosa, solista da Ópera do Teatro Municipal de São Paulo. Na época ela estava cantando na Silent Cry e ficamos amigos. Para a gravação ela convidou o grande cantor Eduardo Bueno, também da Ópera do TMSP, e fizeram um trabalho sensacional. Passamos a noite gravando lá no Mr.Som e foi tudo maravilhoso. Pena que ela não conseguiu conciliar sua agenda de música erudita com o Metal.

– Em 2006, ainda na turnê de “Centurian”, o MALEFACTOR foi confirmado na edição daquele ano do Wacken Open Air. O que você pode nos contar sobre esta experiência? Na verdade, pouca gente viu fotos e vídeos deste show. A banda ainda pretende lançar este material algum dia online?

Lord Vlad – Na verdade o Wacken foi o primeiro show da tour do “Centurian”, e o disco ainda nem tinha saído, tanto que levamos copias do material ainda como promo, não tinha para venda. E o segundo show da tour foi o BMU de 2006, no Espaço das Américas em São Paulo. A experiência de tocar no Wacken é bem inusitada para uma banda underground, ainda mais uma banda brasileira. Éramos a única banda da América do Sul, no meio de mais de cem bandas. Tudo foi tão rápido que eu não me diverti durante o show. Era um desafio enorme para nós provarmos que podíamos impressionar uma plateia como aquela, que assiste muito mais shows do que os brasileiros. Para mim foi um alivio quando o show acabou, porque eu sabia que não podíamos falhar ou fazer um show mais ou menos. Demos conta do recado, e foi um show foda. Tivemos sorte e azar ao mesmo tempo. Sorte porque no primeiro dia são menos bandas e quase não havia bandas de Metal extremo, então ficou lotado o espaço, que é um palco menor para três mil pessoas. Azar porque a imprensa brasileira não conseguiu pegar os passes em tempo hábil e só chegou já no final da nossa apresentação, por isso poucas fotos e vídeos foram feitos, e não tivemos acesso a quase nada. Lembre-se que estávamos em 2006. Hoje quase todo mundo tem um smartphone com uma câmera que fotografa e filma muito bem, não era assim 15 anos atrás. A empresa responsável pela filmagem oficial nos entregou um material com uma qualidade de áudio tão ruim, que usamos somente alguns recortes no nosso documentário “25 anos sob a lei da Espada” de 2017, mas com o áudio do disco. Acredite, o trabalho dessa empresa é um lixo e eu fiquei muito puto. Hoje todo mundo que toca lá tem seu show registrado de graça e passa ao vivo no YouTube. Na época a banda teria que pagar para ter o material. Acredite, não valia pagar por aquela merda de vídeo. Fora isso, o show foi do caralho e pudemos conhecer e tocar com um número enorme de bandas fantásticas, várias entre as melhores do mundo. Sempre brinco que uma namorada uma vez brigou comigo e disse “você acha que vai conseguir o que com essa banda? Tocar na Europa com o Morbid Angel? Bem, eu toquei na Europa, e pro azar dela, com o Morbid Angel.

– Apenas em 2013 “Anvil of Crom”, seu quinto álbum, é oficialmente lançado no Brasil. O material soa complexo e é o mais ousado na carreira da banda até aqui, trazendo inclusive elementos do Rock/Metal dos anos setenta. Particularmente, acho que é um álbum que requer muitas audições para conseguir captar todos os detalhes contidos nele. Como se deu os processos de composição e produção de “Anvil of Crom”?

Lord Vlad – Você definiu muito bem esse álbum. Acho que foi uma época que estávamos muito empolgados pelas coisas que vinham acontecendo, e acabamos fazendo músicas para dois discos. O “Anvil of Crom” tem setenta minutos, com músicas complexas, longas, das quais só tocamos duas ou três ao vivo na época, então decidimos que não vamos mais fazer discos tão longos. Você leva dois, três anos para compor e ensaiar um material daqueles, e as músicas que não são tocadas ao vivo ou tem videoclipe acabam meio que esquecidas. Dali pra frente decidimos deixar as músicas mais curtas e mais diretas. Amo esse disco, e acho a capa dele belíssima. Pena que ele saiu na época que nosso selo faliu, então ele não teve nem de longe o mesmo suporte promocional dos discos “Barbarian” e “Centurian”.

“Anvil of Crom”, a faixa título, é meio que obrigatória em todos os shows da banda. Quais composições deste álbum que mais renderam retorno positivo nos shows de vocês?

Lord Vlad – A música mais conhecida do MALEFACTOR, com certeza, é “Elizabathory”, que está nesse álbum. Todo local do Brasil que tocamos a plateia pede, e muitos mandam mensagens pelo Facebook ou Instagram pedindo ela no set list, antes de chegarmos nas cidades. Tocamos “Anvil of Crom”, “Blood of Sekhmet” (que também teve um videoclipe) e “A Guerra Virá” em vários shows nesta época. Sempre quis tocar “The Mirror”, que acho a melhor do disco, mas sempre fui voto vencido. É a vida (risos).

– “A Guerra Virá” contou com a presença da vocalista Hecate da horda Miasthenia. Além de ser a primeira composição em português do MALEFACTOR, por quais outras razões pensaram na inclusão da cantora nesta faixa?

Lord Vlad – Susane, a primeira vocalista de Black Metal do Brasil, também é da área de História, assim como eu, e ela sempre cantou em português. Acho o Miasthenia uma das melhores bandas da América do Sul. Como não tenho experiência em compor letras em português e as bandas ficaram muito amigas, achei natural o convite, afinal além de amiga, ela é a melhor no que faz que é fazer Metal pagão em português. A amizade das bandas se solidificou tanto que fizemos um projeto mesclando alguns membros das duas, chamada Born in Black (já temos dois discos lançados). Amo essa música. Ela tem clima de guerra casando perfeitamente com a letra que é minha e dela. Muito mais dela, claro (risos).

– Antes do lançamento de “Sixth Legion”, seu último álbum até então, a banda sofreu uma forte baixa em sua formação, com as saídas do baterista Alexandre Deminco, do baixista Roberto Souza e do tecladista Chris Macchi. O que de fato ocorreu para isso ter ocorrido neste momento na carreira de vocês?

Lord Vlad – O fator predominante foi que Alexandre já não estava se dedicando e tocando tão bem como antigamente. Hoje vejo que as coisas foram resolvidas da forma errada. Mas a banda estava praticamente morta. Praticamente não fazíamos mais shows fora da Bahia, as turnês na Europa viraram lenda, eternos projetos e a qualidade dos shows estava caindo. Chegamos a começar a gravar o disco com essa formação, mas não estava nem perto do que queríamos. Quando ele saiu, chateado, mais dois músicos resolveram que iam sair também. Um já havia me confessado que se sentia meio que atrapalhando a banda, mas não disse isso na reunião, e o outro disse que ia ficar e mudou de ideia um dia depois. Fato que a banda melhorou muito ao vivo, e as coisa ficaram mais fáceis e rápidas para serem resolvidas. Antes eram dias para conseguir marcar até mesmo um ensaio, já que todos trabalham, a maioria tem filhos e alguns moravam em outras cidades. Mas sentimos saudades de todos eles, e vez ou outra nos falamos.  A pandemia nos afastou mais do que o fato deles saírem da banda. Infelizmente a vida é assim. Gostaria muito de ver todos eles tocando Metal novamente, nem que fosse sem compromisso, porque dedicaram mais da metade das suas vidas ao Metal. Acho que somente Chris (tecladista) continua tocando, mas em projetos de cover.

“Sixth Legion” foi lançado em 2017 já contando com a presença de Daniel Brandão (Headhunter D.C., ex-Insaintfication) na bateria e você, Lord Vlad, assumindo o contrabaixo. Acredito que esta tenha sido a primeira vez que vocês se assumiram como quarteto na história da banda. Como foi a adaptação a este novo modelo e como foi a turnê deste álbum no país?

Lord Vlad – Não. Na verdade de 1991 até o começo de 1993 éramos um quarteto, já que não tínhamos teclados, e eu cantava e tocava guitarra base. Isso inclusive explica porque eu apareci tocando baixo e muitos achavam que eu era um prodígio, porque já cheguei tocando legal. Mas eu sempre toquei violão, guitarra em casa. Sempre compus pro MALEFACTOR e pra outros lances aqui e ali. A turnê foi excelente. Desde o “Barbarian” que não tocávamos em tantas cidades do país. Na tour do “Sixth Legion” fomos literalmente de Norte a Sul, e tocamos em festivais como Palco do Rock, Guarú Metal Fest, Maniacs Metal Meeting, Abril Pro Rock, Rock in Concha, Dopesmoke Fest, todos eventos de médio e grande portes com bandas internacionais e nacionais. Fora os shows da própria banda. Exatamente como achávamos que seria, não só por ser mais barato levar quatro caras de forma geral, como pela habilidade e rapidez para fechar tudo, já que os quatro pensam bem parecidos sobre turnês. A adaptação foi rápida já que somos músicos com décadas de atividade. O público demorou um pouco. Porque foi uma mudança grande, mas hoje está tudo ok e se a pandemia não tivesse nos atrapalhado, as coisas estariam bem melhores para todos.

– Em “Sixth Legion” foi incluída uma versão excelente para “Down at the Valley of the Great Encounter” da banda grega Horrified. Por qual razão vocês optaram por registrar esta música e o que o Horrified representa na carreira do MALEFACTOR?

Lord Vlad – Nós sempre gravamos covers, desde a época do “The Darkest Throne”, inclusive quero lançar um CD reunindo todas estas gravações em um material especial. O Horrified foi a banda que mais nos influenciou no meio da década de 90 e depois que conhecemos essa banda, e por consequência caímos de cabeça na cena da Grécia, nosso som mudou bastante. O disco “Celebrate Thy War” com certeza é um filho bastardo deles (risos). Acabei trocando vários e-mails com alguns dos caras do Horrified, principalmente com o vocalista Gore e quando fiz a proposta pro MALEFACTOR de tocarmos essa música, que pra mim é uma filha épica e satânica de “Orgasmatron” do Motörhead, todos ficaram satisfeitos. Infelizmente ele não gravou participação nas vozes, pois disse que não consegue mais fazer gutural. Parou desde o começo dos anos 2000. Tivemos a participação do nosso irmão Paulo da grande Kataphero, outra banda brasileira muito influenciada pelo Metal grego. Inclusive todos os membros que eram da Kataphero estiveram numa mini tour que fizemos juntos, depois gravaram backing vocals para nossa versão de “Alma Mater” do Moonspell.

– Em 2020 a banda nos surpreende com uma música gravada no período da pandemia. “Medusa” traz um MALEFACTOR bem diferente, sem linhas extremas nas vozes, e uma sonoridade que me remeteu muito ao Black Sabbath. Confesso que demorei para entender estes experimentos. Por qual razão vocês optaram por percorrer um caminho tão diferente nesta composição?

Lord Vlad – Na verdade desde o primeiro disco que temos vocais limpos, inclusive chegamos a gravar algumas musicas Folk/épicas nos dois primeiros álbuns, sem distorção alguma. “Medusa” foi composta por mim sem pretensão de lançar pelo MALEFACTOR, tanto que é uma gravação caseira e toquei todos os instrumentos da base. Mas a banda resolveu incluir no nosso repertório. Ela é inspirada realmente em Sabbath e na segunda fase do Bathory, com coisas do MALEFACTOR, afinal sou eu cantando. Iremos regrava-la numa versão mais curta e com produção muito melhor no futuro.

“Medusa” traz ainda a participação de diversos músicos, principalmente guitarristas, no decorrer dos seus mais de nove minutos de duração. O que você pode nos falar sobre estas participações?

Lord Vlad – A versão que está nas plataformas digitais e tem um videoclipe no YouTube, conta com vários amigos guitarristas de bandas irmãs fazendo solos, além da violinista Karen e todos fizeram participações primorosas. Inclusive ao vivo o início com o violino será mantido e, quem sabe um dia, a gente não consiga reunir todos os guitarristas no palco juntos com o violino para fazermos uma versão dela ainda mais louca? Cada um gravou em sua casa, mantendo a essência de Demo da faixa, já que a ideia era produzir algo dentro de casa, em isolamento, por motivos óbvios. Adoro o resultado final, mesmo com a sonoridade rudimentar por ter sido minha primeira experiência gravando tudo em casa. Só a voz que fui gravar com Vicente Fonseca, porque não consegui captar em casa de forma que eu gostasse.

– Em 2021 a banda lançou a compilação “Old Demons”, que traz as suas duas primeiras Demos, além de faixas raras ao vivo e regravações das clássicas “Sickness” e “Misery Portrait”. Eu acredito que esta tenha sido uma correção muito bem vinda na discografia de vocês, tendo em vista que a primeira Demo Tape jamais tinha saído neste formato anteriormente. Você concorda com meu ponto de vista?

Lord Vlad – Concordo totalmente, e quero convencer os caras a tocar pelo menos uma das regravações ao vivo, já que também são filhas nossas e quando as tocávamos na década de 90 eram matadoras. A produção gráfica ficou lindíssima e as pessoas sabem que fora as regravações é um material die hard, de época, tirado de antigas fitas k7. Vale muito a pena ter uma cópia desse material.

– Em 2022 todos ainda sofriam com os efeitos da terrível pandemia, mas as atividades do MALEFACTOR seguem inalteradas. O que foi realizado por vocês desde então?

Lord Vlad – Nossas atividades estão bastante alteradas para ser sincero. Tivemos dois shows grandes adiados, um com UDO e outro com o Krisiun, ambos como headliners, e não fizemos o Dopesmoke Fest 2021 por causa da pandemia. 2022 foi um ano que aproveitamos para gravar bastante coisa e voltamos aos poucos com os shows.

– Em 2024 o álbum “Barbarian” foi relançado, pela primeira vez na versão em LP. O que você pode nos falar sobre este projeto?!

Lord Vlad – O relançamento do “Barbarian” foi uma ideia que surgiu após um convite de um selo de Sergipe. Tinha nos sondado pra fazer o lançamento, mas acabou que o projeto não foi pra frente, e quando comentei com alguns amigos daqui da Bahia, que têm selo e loja de discos, eles resolveram abraçar o projeto. A partir daí foi muito rápido todo o processo. Passei tudo que queria para minha mulher, e ela fez todo o trabalho gráfico para o LP e para a revista especial “Evil Arise”, com os músicos daquela formação contando histórias da época do lançamento do disco e da turnê do mesmo. A revista veio com muitas fotos da época, bem como todas as letras dissecadas. Foi um trabalho que nos deu muito orgulho. Agradecimento aos quatro selos da Bahia, que se juntaram para fazer esse LP: Black Order Productions, Discodelia, Big Bazar e No Salvation. A venda do mesmo aconteceu de uma forma muito rápida. Ainda temos cópias, mas saiu bastante já. Ficou um trabalho fantástico. Capa linda, encarte maravilhoso. Então é isso, “Barbarian” completou 20 anos e foi homenageado da melhor forma possível.

– O MALEFACTOR gravou um novo EP que contará com três faixas. Pode nos contar um pouco mais sobre esta empreitada?!

Lord Vlad – Inicialmente seriam só três faixas. Duas para um 7″ EP e uma para um split 7″ EP. Depois decidimos gravar mais uma música e convidamos nossos irmãos da Aztlan que irão dividir este split 12″ EP em vinil, conosco. Tocaremos três destas músicas novas no nosso show de retorno dia 26 de outubro em Salvador. Provavelmente serão os mesmos selos que fizeram o lançamento do “Barbarian” em LP, que assinarão este trabalho também. Os títulos das quatro músicas são: “Cristozofrenia”, “Baron Samedi”, “Aghori” e “The Sentinels of the Tomb of Thugra Khotan”.

“Baron Samedi” é um dos Singles a ser extraído do EP. Ele também ganhará uma versão em videoclipe. Do que se trata esta faixa e como, musicalmente, ela se enquadra na atual fase da banda?!

Lord Vlad – “Baron Samedi” é o mais conhecido Loa do Vodu haitiano. Outrora retratado como vilão de filme de 007, e foi ali que sua figura macabra e poderosa chamou minha atenção na infância. A entidade é respeitada e adorada como o detentor da aceitação ou negação de um indivíduo no Reino dos Mortos. Algumas semelhanças entre o Baron e Exu chamam atenção a primeira vista. Presente nas encruzilhadas, debochado, sábio e apreciador de tabaco e bebida alcoólica. Meu pai é doutor em Antropologia e sempre se dedicou aos estudos de religiões não cristãs pelo mundo, chegando a ir a rituais de Vodu na República Dominicana, que divide a Ilha de São Domingos com o Haiti. Sobre nossa fase atual, desde que decidimos ser um quarteto estamos adaptando partes de teclados nas guitarras e também usando samplers ao vivo, com orquestrações e corais. Isso ampliou nossas possibilidades e músicas como o Baron virão muito especiais ao vivo. Quem presenciar, vai sentir a energia.

– Mais uma vez, obrigado pelo tempo cedido. Fica aqui o espaço para as suas considerações finais…

Lord Vlad – Muito obrigado sempre pela lembrança e respeito com o MALEFACTOR e um abraço à todos. Longa Vida! Stay Evil!!

 
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